Estamos chegando ao final de 2020. Um ano difícil e intenso.
Depois de mais de 9 meses do início de uma pandemia (aqui no Brasil) que parece não ter um fim tão próximo, como estamos terminando 2020? O que sobrou de nós?
Confinadas em casa há tanto tempo, numa rotina angustiante de “não poder sair, manter o isolamento social, ter que higienizar as mãos a todo instante, limpar as compras, as maçanetas, limpar os sapatos, não dar as mãos, não abraçar, não beijar, usar máscara o tempo todo, treinar em casa”, (ufa!) tenho escutado por todo canto a palavra “reinventar“.
Confesso que essa palavra me intriga um pouco: afinal como “inventar algo que já foi inventado?” Não faz sentido. Por curiosidade, fui buscar no dicionário para ter certeza de que ela existia; e existe! E descobri que quando essa palavra foi inicialmente utilizada em 2010 (Oscar Niemeyer resolveu compor uma música; escreveu um samba e um jornal o descreveu como “um grande brasileiro acaba de reinventar-se”), tinha um sentido irônico, debochado, sobre alguém que dizia que iria fazer uma mesma coisa que outro já tinha feito, “parecendo” inédito.
É preciso lembrar que inventar é diferente de descobrir; descobrir é encontrar algo que já existia, oculta ou talvez escondida. Inventar é outra coisa: é criar algo que nunca existiu. Para isso exige-se conhecimento, imaginação, criatividade.
Quero entender que quando alguém usa a palavra “reinventar” está se referindo a deixar pra trás o que passou, o que fizemos, o que éramos, para nos tornar outra coisa. “Alguém” que nunca existiu. E talvez seja isso que me cause “ruídos”….o que somos hoje são os resultados de todas as escolhas que fizemos; não há como deixar nada pra trás. Os erros ou acertos que cometemos nos trouxeram de alguma forma até aqui; por caminhos mais tortuosos talvez, mas ainda sim estamos aqui.
Levantamos, caímos e levantamos outra vez. Mas não nos “inventamos de novo”; eu acredito que descobrimos um jeito novo de fazer as mesmas coisas ou um talento novo que estava ali, adormecido quando diante de uma dificuldade começamos a fazer outra atividade que não aquela que estávamos habituados: fazer vídeos, falar diante das câmeras, cozinhar, vender algo, pintar, escrever… Tenho amigos aikidokas que vivem dessa arte marcial e de repente se depararam com uma realidade completamente diferente e tiveram que adaptar seus treinos, sua rotina e alguns foram literalmente fazer outra coisa para obter algum recurso financeiro: fabricar máscaras, fazer pães, vender doces, realizar seminários com outros grupos, aulas teóricas, etc.
Mas eles não se reinventaram! Mesmo que o dicionário dê o significado de “adaptar ou buscar uma solução para um problema“, ainda prefiro acreditar que a palavra correta, neste momento, seria “renovar”, – que seria algo como “ficar outra vez como novo” (de acordo com o dicionário).
A pandemia trouxe com ela muitas coisas ruins: o afastamento, isolamento, a falta do convívio com amigos e familiares, o medo de ficar doente, medo do desconhecido, conflitos internos sobre no que podemos acreditar ou descartar. Interrompemos sonhos, projetos, viagens. Hoje só temos a certeza de que não temos certeza de nada.
Mas, particularmente, trouxe coisas positivas também: eu pude desacelerar, ficar em casa e cuidar dela com mais carinho (a gente queria tanto um tempo para isso não é mesmo?). Conheci pessoas incríveis através de aulas on-line e redes sociais, que talvez nessa correria maluca da gente eu não teria a oportunidade. Participei de vários seminários de aikido com senseis de diversos lugares do mundo: Singapura, Ucrânia, República Tcheka, Ilhas Canárias, Polônia, Amsterdã, EUA e outros senseis do Brasil que só a internet pôde proporcionar esse encontro. Me aventurei em alguns cursos de caligrafia e conheci feras nesse outro caminho que escolhi pra mim. Caminhos que se cruzam o tempo todo: “Conhecendo a essência, tudo é possível!” “Pratique, treine. Não há outra maneira de sair do mesmo lugar, mesmo que sua evolução seja lenta.”
Renovamos nossa maneira de estudar o aikido. O treinamento individual pôde ser de fato explorado, adaptado e realizado. E na minha opinião foi isso que sobrou: nossa capacidade de renovação!
“O Livro dos Cinco Anéis” de Musashi, no capítulo de “O Livro do Fogo”, há um parágrafo que fala sobre renovar-se: “…livre-se de suas amarras, adote o espírito de começar de novo e com esse ritmo, conquiste a oportunidade de vencer. Renovar-se significa trocar imediatamente de tática quando a luta tende por um ´beco sem saída´.”
Acredito nisso: mudar a tática; mudar o jeito de lidar com aquele obstáculo. E o aikido nos ensina muito isso: se aquela técnica não deu certo, tente outra coisa! Seu oponente continua alí, é o mesmo! Você ainda tem a mesma problemática e não vai poder se “reinventar” pra conseguir resolvê-la; precisa renovar a abordagem.
Portanto, RENOVE-SE! Fique novo, de novo! E aqui, mais uma vez o aikido nos fazendo refletir: mantenha a mente de principiante (shoshin) para encontrar sempre o novo e o início dentro de você!
Desejo a todas e todos, um Feliz Natal e que em 2021 possamos continuar a exercer essa nossa ilimitada capacidade de nos renovar!
Fiquem bem! Ainda temos um longo caminho pela frente até a vacina chegar pra todos! 😉
“O lema de hoje é renovar…
Renovar ideias, pensamentos e atitudes…
Renovar a energia e o propósito da vida…
Renovar a vontade de chegar…
Renovar os sonhos, a fé, a alegria…
Renovar os sorrisos, a vivacidade da pele…
Renovar a cor e o brilho da vida…
Renovar a autoestima…
Renovar-se e sentir-se renovado.
Renovar o compromisso de ser FELIZ.“
Linda reflexão minha amiga! Pra mim fez todo sentido! Dentro desse contexto tem um poema de autoria de Rudolf Steiner que eu gosto muito! Com a sua permissão vou deixar registrado aqui!
“Perseverar é aprender,
Aprender é praticar,
Praticar é repetir,
Repetir é ganhar experiência,
Ganhar experiência é crise,
Crise é prova, fortalecimento,
Fortalecimento é liberdade,
Liberdade é criar a partir de si mesmo,
Criar a partir de si mesmo é transformar-se,
Transformar-se é o caminho,
E o caminho é o começo e o fim ao mesmo tempo.”
Rudolf Steiner (pai da Antroposofia)
Boas Festas!
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Ah! Obrigada Edu! Lindo poema! Que bom que pude provocar uma reflexão! beijao
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